"Quem tinha tempo para a poesia? Pois ela comprou um carrinho invisível e começou a catar palavrão" Rita Apoena

9.3.16

Mais uma constatação




A pasta estava pronta, todos os anos cuidadosamente separados em meses, mas eu nunca tive coragem de excluir as fotos. Nem de jogar fora a 3x4 na minha carteira, nem de mudar o nome no meu celular, nem de me desfazer daquele livrinho com dedicatória. Eu tinha me acomodado a ter você, ao conforto da sua voz, ao encaixe do nosso corpo, era mais do que me desfazer de coisinhas pequenas, era excluir todos os sorrisos nos lugares mais legais que já fui, jogar fora a lembrança que eu tinha de que eu não sou daqui, cada vez que eu abria a carteira e via seu rosto quando ia comprar mais um tomate transgênico, tirar aquele apelido no aumentativo que me fazia rir toda vez que você ligava era mudar você dentro de mim, me desfazer da verdade mais bonita que eu vivi e que estava lá naquela primeira página daquele livrinho, era mais do que eu podia suportar.
Era apagar os anos mais floridos,  viver sem ter sorrido, sem ter motivo pra voltar, sem ter graça, nem verdade, porque era isso que você representava pra mim, era mais do que eu esperava que você fosse, era mais uma das descobertas que fiz sobre mim mesma, a descoberta de que preciso de você mais do que supunha.